As manhãs frias vão sempre ficando para trás. Quando o vento corta a pele e o cabelo chicoteia a cara. O céu de tons cinzentos. No caminho perdem-se pensamentos. Desperdiçados. Jogados ao vento. Outros guardam-se. Jogam-se outros à chuva, quando a há, levados pela água para portos desconhecidos e não-seguros. Outros ficam guardados a sete ou oito chaves. Levam-nos a chuva que limpa a alma. Os dia frios ficam sempre para trás. As noites geladas acompanham com os uivos do vento os sentimentos. A chuva bate no chão como bate o coração. Sentimentos guardados a sete ou oito chaves. O céu negro que aterroriza, ameaça. Presságio. Mas os dias frios ficam sempre para trás. Diz-se que o Sol nasce todos os dias. E quando se ergue no horizonte, ainda fraco, faz brotar pensamentos alegres. Abrem-se janelas para deixar o Sol entrar. Entrar ar. Arejar casas e cabeças. Roupa leve acompanha passos, torna mais fáceis de carregar os pensamentos que se jogam pela janela. Pairam no ar. Quem os apanha? Ninguém os ouve. São meros múrmurios que ecoam no vazio. A brisa leva-os. Lenta. Ainda podem ser apanhados, se não escorregarem por entre os dedos trémulos. Medo de os apanhar. Bocadinhos de verdade, de possibilidade escondidos neles. Bem escondidos. Mal se vêm. Suspeita-se. Ficam presos nas folhas verdes brilhante que os libertam. Pesam demais esses pensamentos. Talvez se fossem levados pela chuva que já não vem... Mas mesmo na chuva, ficariam presos nos grãos de areia. E seriam arrastados pela brisa para a janela. As teias tecem-se. Fios finos, delicados, sensíveis. Tecem-se em várias direcções. Partidos, quebrados, despedaçados. Mas voltam sempre a ser unidos. Senão esses, outros iguais. Pensamentos que tentamos expulsar que voltam. Arrastados. Levados. Jogados. Desperdiçados. Guardados a sete ou oito chaves. No caminho que se vê à frente. Caminhos indefinidos, infinitos nas possibilidades assustadoras. Esperança na linha do horizonte. Sorri-se. Os raios do Sol tocam a cara ferida pelo vento. Aquecem o corpo, aconchegam a alma. Céu azul. Alaranjado no pôr da sua principal estrela. O brilho do mar, como estrelas. Como milhões de caminhos. Quais percorrer? O que escolher? Por onde ir? Deixa-se ser arrastado pelo vento, pela brisa. Cepticismo no destino, por alguns. Crença na Natureza que nos leva, transporta ao desconhecido. Aos pontos de interrogação da vida. Assombrados pela dúvida. Sombra quando o Sol brilha ao se pôr. Sombras grandes, largas, frescas. Pensamentos aí divagados. Perdição. Teias. Tudo se relaciona com tudo. É um nada quando se sai da sombra. Nada passageiro. A Lua lança habilidosamente a sua sombra. Matreira. Persegue amantes que procuram o conforto no amor um do outro. Em toques e beijos secretos que só ela testemunha. Lua invejosa. Amantes que escolhem caminhos ao Luar. E os percorrem pelo Sol. Para todos verem. Nada escondem. As folhas soltam-se dos ramos para serem arrastadas pelo vento para a porta de casa dos pensamentos. Todos voltam. Nenhum é esquecido. Segredos contados aos ouvidos dos amantes, quando a Lua brilha no alto. O luar guarda as palavras relembradas no Sol. Pensamentos desperdiçados jogados no papel como palavras sem sentido. Guardados a sete ou oito chaves. Absorve o papel que ganha ao tempo. Esse injusto, que passa por nós sem nos perguntar se queremos mudar alguma coisa. Sim, dira-lhe eu. Que o vento te traga para perto de mim. Com os nossos pensamentos e sonhos. Que as folhas fiquem presas na minha janela. Que a corrente da chuva me leve até ti. Que te tragam de volta quando fores.