Saturday, August 20, 2011

carta ao pai #12


pai,

para todos os lados onde íamos. santiago do cacém. para a direita. para a esquerda. em frente. todas as estradas me queriam levar até ti, pai. e eu reconheci cantos e recantos. e quis contar-te tudo. que estive em são torpes e em sines e andei perto do paiol. passei pela soneca (sonega) e reconheci a estrada. e tive de me esforçar para não dizer "a ver se pergunto ao meu pai se nós quando vínhamos à pesca, vínhamos para estes lados. é que eu conheço esta estrada." e são torpes. lembrei-me da última vez que lá estive. com o fábio. sabes que vi o fábio, pai. não nos víamos há anos. e os anos não nos fizeram qualquer diferença. continuamos a ser os primos que sempre fomos desde pequenos. e sabes que queria lá ter ido. a santiago. queria ter ido à casa da tia glória e à casa da tia emília e à rua da escola. à rua da escola. à rua da escola, pai. e sabes que no regresso era capaz de jurar que tinha reconhecido a "nossa" saída para santiago. e acho que contornei toda santiago do cacém. e não pus lá os pés. na cidade. mas sabes que me senti em casa? sabes que fazer estradas que sei que fiz durante tantos anos me soube a estar em casa. ir a são torpes, então. e sines. não me lembrava de sines. lembrava-me só do quiosque. da casa dos primos. mas são torpes parece que nunca esqueci. falei disso com o fábio. há anos. e outras coisas parvas, pai. a gambia e o pinheiro por causa da tua piada. história? acho que história. aquela. tu sabes. "olha o pinheiro, marques". albergaria lembra-me de ti, não sei porquê. e estradas e caminhos e vezes que pensei que tu saberias. tu conhecerias. tu poderias dizer-me. e eu queria dizer-te que estive aqui e ali. e tu irias perguntar-me por onde fui. e eu respondia. e iríamos os dois ficar a debater estradas e caminhos. e tu ias teimar que seria melhor por outro caminho, ou que a estrada que eu segui não existe e ambos sabemos que iríamos acabar debruçados sobre o mapa [tal pai, tal filha] e eu dizia-te que tinha ido por aqui e apontava-te com o dedo, enquanto tu punhas e ajustavas os teus óculos e olhavas com atenção. e eu dizia-te. aqui e passei aqui. e tu terias algo a dizer-me sobre as estradas e sobre os sítios e quem lá mora. e tudo, pai. e contar-te tudo. e rires de ter andando às voltas em setúbal. em setúbal! e nem preciso de me esforçar para te ouvir dizer por onde deveria ter ido. e as tuas conversas ressoaram em mim toda a semana, pai. e o teu riso e o que me terias dito. e saber que estive tão perto de casa, tão perto da tua casa. e sentir-ma lá bem. e um dia vou lá, pai. prometo. mas se não foi desta, é porque ainda não era para ser. um dia vou lá. e vou ouvir as tuas histórias e as tuas conversas. prometo. garanto-te. eu posso garantir porque te oiço sempre, onde quer que esteja.


Tuesday, August 09, 2011

# 106

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar.
É preciso aceitar esta mágoa esta moínha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.
Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha.
Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.
O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar. 



Miguel Esteves Cardoso, Último Volume


# 105

querido, r.,

i miss you. lembro-me de tudo, sabes? das noites transformadas em madrugadas transformadas em manhãs. lembro-me de tudo. das palavras que dizias. dos sorrisos que eu te lançava. sabes que contei partes da nossa história e sabes que ainda abrem muito os olhos quando lhes conto que fugi contigo e ainda parecem ver o que nós sentimos? sabes que tenho passado minutos na janela. à espera. r., always & forever. lembro-me de tudo, r. sabes que se me pedisses para ir, eu ia? não por estar perdidamente apaixonada, mas por seres tu. e porque iria onde me levasses. [lembraste?]

i miss you. às vezes, passeio até ao passado. não sempre, mas quando passeio, faço questão de lá ir buscar o que sentia, para me sentir viva, para saber que ainda me é possível sentir. sabes que estar sem ti ainda me sufoca. desculpa. desculpa. desculpa, mas sufoca. sabes que contigo é tão fácil e simples que às vezes, retenho a respiração e fico suspensa no tempo a observar de coração nas mãos o nosso desenrolar. ainda somos tão nossos na nossa maneira de ser. somos tão naturais que não é sequer normal. não me entendas mal. se te escrevo aqui, é porque, se calhar sinto que já não tenho o direito de te dizer isto. e sim, eu sei. posso sempre dizer-te tudo. mas sabes. quando falo contigo, sai-me o teu nome. e quando te escrevo, tenho de apagar muitas vezes a palavra amor e substituí-la. escrever-me sai-me mais da alma, e para a minha alma ainda és amor. still.

i miss you. e trocávamos músicas e falávamos de tudo e de nada e íamos devagarinho sussurrando para os cantos um amor que ainda nos era desconhecido e que hoje. after all this time. hoje ainda não nos largou completamente. will it ever? confesso que te quero levar no meu coração sempre. sabes porque corro para ti quando preciso de algo, de alguém? porque é fácil. porque me deixas ser e sabes ser comigo e para mim, sendo tu.

i think about you every day, amor.
fico deitada a pensar em ti, amor.

não me odeies por voltar a escrever-te aqui. sabes que se deixei foi por isto e por aquilo. 
querido r., se dependesse de mim, terias toda a felicidade do mundo, mesmo que não acredites nela.
sabes, quando páro para pensar um bocadinho naquilo que chamo "wtf are we doing?", penso que o que estamos a fazer é a nossa maior prova de amor [como se alguma vez tivessem sido necessárias]: querer que o outro esteja bem, como quer que seja e apoiando sempre. sempre, r.

always & forever.

sabes que em tempos me disseram aqui que eu descrevia o amor como ninguém. se calhar, é porque o senti além do amor. se calhar, foi porque. e porque.
e sabes que sorrio quando penso em nós? penso que somos tão grandes face à vida e face a tudo. penso que, vistas bem as coisas, sobrevivemos a tudo. tudo tudo.

onde outros tombaram, nós continuamos de pé. juntos. sempre, caminhando por perto. sempre lá, r. sempre.

always & forever.



duh

depois ocorreu-me: e escrever, marina?
andas com este ano e tal a sufocar-te as entranhas porquê?

pois.


Monday, August 08, 2011

carta ao pai #11

pai,

merda.
ajuda-me.
o que é que eu faço?


Thursday, August 04, 2011

# 104

i meant:
i'm sorry. it's not ok.
yet.